Inovação Remota da Imperfeição 1/2
Abordando o processo criativo que diferenciou a vida em nosso planeta a partir de agentes transformadores instalados na matéria, existe a possibilidade de entender a inovação como parte de um processo experimental que busca imperfeições e não acertos?
Sabemos que todas as espécies terrestres são formadas por moléculas de proteínas. Também sabemos que essas moléculas são responsáveis pela rica biodiversidade, milhares de exemplares (também os extintos) que tiveram seus modelos transformados durante eras por um fato outorgado, a evolução das espécies.
Embora o termo evolução sugira um desenvolvimento adaptativo em metas de aperfeiçoamento, um grande confronto teórico intercepta esse fenômeno intrigante. Criacionistas e darwinistas têm muitas razões para divergirem. Enquanto o Criacionismo assombra o Darwinismo citando descontinuidades nas linhagens fósseis evolucionárias, as chamadas lacunas fósseis, levantando problemas com a evolução acelerada, o Darwinismo, por sua vez, materializa a questão através da ciência e do determinismo genético, desconsiderando a figura de um criador para acreditar na produção aleatória de variações que são testadas através da interação com o meio.
Apesar dessas grandes divergências, aparentemente contraditórias, a física quântica identificou novos rumos interdisciplinares para essa discussão. Por exemplo, acreditando que a Biologia pode ser complementada pela indeterminação e pela escolha por uma consciência quântica, o físico Amit Goswami destacou três pontos principais dessa questão: as lacunas fósseis, a diferença entre vida e não vida e o desenvolvimento de um embrião até a fase adulta. Tratando do processo criativo realizado pela natureza, encontro sentido em analisar o terceiro ponto, que pode esclarecer o mecanismo de diferenciação das espécies, principalmente da nossa, que ora aparenta ser programado e aleatório, ora apresenta ser conduzido por uma consciência criativa e divina.
A evolução é um fato provado por estudos do RNA (ácido ribonucléico) e do DNA (ácido desoxirribonucléico), que são as moléculas “programadas” para aplicarem o projeto das criaturas. Essas moléculas que organizam o material genético evidenciam que as espécies terrestres são descendentes lineares de um único ancestral. O RNA provavelmente foi o primeiro ácido nucléico a existir, é o que indica a simplicidade de sua estrutura e a sua capacidade de autoreplicação. Os ácidos nucléicos são moléculas longas e complexas, de elevado peso molecular, constituídas por cadeias de unidades denominadas mononucleotídeos.
Os ácidos nucléicos têm a capacidade de controlar o metabolismo celular e de transmitir características hereditárias às gerações futuras, através da organização evolutiva que transcreve e traduz as informações contidas nas cadeias de mononucleotídeos. Digo organização evolutiva porque o mecanismo da evolução é a seleção natural que se aplica a partir de manifestações já existentes, ou seja, esse mecanismo não explica o surgimento do primeiro ser unicelular heterotrófico. Por isso, a seleção natural não busca criar resultados perfeitos, e nem poderia devido às constantes transformações do meio, na verdade ela cria pequenas diferenças que são colocadas à prova. Mas a priori, onde essas diferenças podem ser encontradas?
Podem ser encontradas no material genético (DNA, RNA) em nível molecular, quando observamos a replicação do DNA, um processo que obedece regras combinatórias exatas, mas que pode resultar em minúsculas “imperfeições” nas sequências formadas pelas quatro bases existentes (Aglutinina, Guanina, Citosina, Timina), que são os componentes dos mononucleotídeos. Dessa forma, a linguagem que ativa o material genético contém variáveis intangíveis que transformam a natureza prolífica através do não cumprimento ou da anti-programação.
Sendo assim, a linguagem genética é uma criação do universo que se traduz pela evolução das espécies e pelo mecanismo da seleção natural e artificial, no que tange a inteligência autopoiética adquirida. Ora, se a criação da diferença passa pelo Dogma Central da Biologia Molecular que considera dois eventos criadores de proteínas, (RNA cria DNA que gera Proteína) e (DNA cria RNA que gera Proteína), a polimerização dessas moléculas é uma das causas do processo de transformação do cosmo e de memória universalista. Logo, a replicação imperfeita dos códigos representa uma variável ligada ao surgimento das diferenças ou novidades do design orgânico. Se aplicarmos essa máxima no campo da criatividade (arte) podemos entender que a inovação pode ser identificada nas imperfeições dos processos e dos resultados, ou a partir delas.
Mas o que a imprecisão da linguagem genética pode significar além de um gesto aleatório criativo? A questão é: quem ou o que permite que se decida por uma diferença, ou pela não programação?