Inovação no Concretismo
Após cerca de uma década de produção, os poetas concretos desenvolveram diferentes vertentes semânticas para a poesia visual a partir de 1960.
Por exemplo, Décio Pignatari e Luís Ângelo Pinto criaram o manifesto da poesia semiótica buscando um poema que dispensasse palavras e fosse estrututrado por meio de um conjunto de signos visuais, atribuições de sentido e esquemas. Uma das características desses poemas semióticos foi a utilização da chave-léxica para descrever associações entre formas e palavras. Uma espécie de legenda que sistematiza a leitura e o sentido do poema. A palavra representava a unidade mínima do poema que criava nexo ou sentido à leitura das formas visuais puras. Veja o exemplo de poema semiótico criado por Ronaldo Azeredo, um jovem poeta concreto que explorou o caráter objetivo da percepção – o poema como mera representação gráfica de uma ideia.
Apesar de experimentarem essa normativa poética, os formuladores desse poema achavam que em alguns casos a chave-léxica era arbitrária, ou uma simples convenção, a exemplo da aproximação entre figuras geométricas e palavras. Isso porque identificaram um distanciamento dessa poesia da teoria semiótica que admite um aspecto formal (icônico), e outro significativo (simbólico), indissociáveis, diferente do resultado dos poemas semióticos.
Na análise do poema “sem título” de Luis Ângelo Pinto, Philadelpho Menezes (1998, p. 75) comenta que “não há nada num triângulo preto apontado para a direita que dê a ele o significado de macho, ou num outro virado para a esquerda que seja mulher; a relação estabelecida na chave léxica entre figuras geométricas e as palavras é arbitrária e forçada”. Outra questão era a falta de conhecimento dos poetas brasileiros sobre a teoria semiótica, fato que teria dificultado a criação de novas propostas para a poesia semiótica no Brasil.
Apesar disso, alguns poemas visuais se revelaram inovadores para o universo poético concreto e para a poesia semiótica. É o caso do poema “o organismo”, de Décio Pignatari. Segundo Philadelpho Menezes (1998, p. 77), “o poema “o organismo” ultrapassou os padrões do movimento concretista ao propor que página após página, o poema faz um movimento de aproximação, entrando dentro da frase, como se ela própria fosse um organismo”. “Na parte final há uma transformação da palavra “organismo” em “orgasmo” e, por fim, as letras “o” acabam simulando vária coisas: seios, nádegas, óvulos sendo fecundados”, analisou Philadelpho Menezes (1998, p. 77).
O poeta pernambucano Pedro Xisto, participante ativo do movimento da poesia concreta e da poética dos Haikais, também inovou a poética dos poemas concretos e semióticos com composições chamadas de “logogramas”, ainda 1966.
Ele conseguiu, através do desenho da letra, determinar o desenvolvimento do poema, porém, a chave léxica se tornou desnecessária nesses exemplos. É o que acontece no poema “longing” e “labirinto”, que dispensa a chave léxica para a integração de sentidos. Por fim, a letra retomou a sua importância a partir desses poemas visuais.
De acordo com o poeta e pesquisador Antonio Miranda, a obra de Pedro Xisto foi um divisor de tempo claro entre o verso discursivo e o ideogramático, entre o lógico-gramatical da fase final do modernismo e o geometrismo da nova poesia, naqueles tempos da construção de Brasília. Também invoca discussões filosóficas históricas, como no caso do poema “Epithalamium“.
Esses poemas indicavam uma nova fase para a poesia visual brasileira. A ordem geométrica deixou de ser seguida e a palavra já não era a unidade mínima do poema. Sendo assim, a letra retomou sua independência e a poesia figurativa não precisou ser indiscutivelmente rejeitada. “Os logogramas, afinal, guardavam algo dos caligramas, e apresentaram novas possibilidades para a poesia visual brasileira na perspectiva do uso de imagens figurativas, desenhos, fotos, ou outra forma; eles são, portanto, o marco inicial de uma poesia visual que já não é mais poesia concreta”, comentou Philadelpho Menezes (1998, p. 79). É também o caso dos livros-poemas, ou poemas-processo, lançados ainda em 1956 pelo inovador poeta Wladimir Dias Pino.