Concretismo: Noigandres
A poesia visual brasileira se confunde com a poesia concreta porque o Concretismo (1956) foi o primeiro movimento literário brasileiro a usar recursos visuais como marca de uma poética.
Segundo Philadelpho Menezes (1998, p. 14), “poesia concreta é um estilo de poesia visual que nasce num dado período histórico, com características bem definidas”.
Considerando que as manifestações artísticas relacionadas com a poesia visual iniciaram-se graças o Futurismo Italiano (1909), no início do século XX, o Concretismo foi um movimento tardio. Todavia, afirmou-se como um movimento de vanguarda de importância internacional que alcançou um estilo único de poema visual. A primeira meta concretista era se distanciar da poesia figurativa, principalmente dos “cligramas” do poeta Guillaume Apollinaire (1880), que tinham idéia evidente e redutora.
O movimento Concretista conquistou admiração internacional e abriu caminho para novas discussões sobre a poesia, o poema e seu visual. Mas isso não se deveu apenas ao experimentalismo dos poetas concretos brasileiros. O Concretismo cumpriu o papel de assimilador dos desdobramentos artísticos internacionais, aproximando a pesquisa artística brasileira da produção internacional em evidência.
Em 1952, os poetas do grupo Ruptura passaram a publicar uma revista chamada “Noigandres”, palavra tirada de um poema do poeta e crítico literário Ezra Pound (1920) que não significa nada, que tinha a intenção de experimentar inovações na linguagem poética (entrevista Pasolini). Foi através dessa revista que o grupo de poetas Noigandres conseguiu organizar as idéias oriundas das vanguardas do início do século XX, apresentando os primeiros resultados da proposta artística do movimento por meio de textos explicativos e poemas visuais. Surgia o Concretismo – uma designação à vanguarda russa dos séculos 10 e 20.
Priscilla Martins (2009) lembra que “estavam ligados ao Ruptura os poetas do grupo Noigandres: Augusto de Campos, Haroldo de Campos e Décio Pignatari, pioneiros da poesia concreta, e dois dos futuros principais nomes do design gráfico brasileiro: Geraldo de Barros e Alexandre Wöllner, que, em 1958, fundaram juntamente com Rubens Martins e Walter Macedo, o primeiro escritório de Design do país, o “FormInform”.
Em 1953, Augusto de Campos criou a “Série Poetamenos” que evidenciou a influência do poeta Stéphane Mallarmé (1897) na pré-produção concreta, através do poema “dias dias dias”, que aproximou o poema visual da concepção de melodia de timbres.
Segundo Philadelpho Menezes (1998), a poesia concreta só se distingue das demais formas de poema a partir de 1955, quando o grupo paulista interage com o poeta suíço-boliviano Eugen Gomringer. Philadelpho Menezes explica que a partir dessa interação o grupo paulista criou do nome “poesia concreta”, e a idéia de organizar um movimento internacional da nova poesia. A forma típica da poesia concreta está associada aos poemas de Gomringer, publicados em 1953, sob o título de “Konstellationen” (“constelações”), e explicada no manifesto publicado pelo autor: “Do verso à constelação: função e forma de uma poesia” (MENEZES, 1998, p. 33).
De acordo com Philadelpho Menezes (1998), são características marcantes do Movimento Concretista brasileiro: o ideograma (apelo à comunicação não-verbal), a atomização (as palavras são desmanchadas, criando outras significações), a metacomunicação (simultaneidade da comunicação verbal e não-verbal), a polissemia (muitos significados) e a estrutura verbivocovisual (valorização do campo visual, do aspecto gráfico da letra, da cor e da disposição das palavras).
Finalmente, o Concretismo fora lançado oficialmente como um movimento de poesia vanguardista brasileira interessado em introduzir mudanças radicais na forma de elaborar poemas visuais. Em 1958, os poetas concretos Décio Pignatari, Haroldo de Campos e Augusto de Campos elaboraram um Plano Piloto que definiu com mais precisão as características essenciais do movimento Concretista, distanciando-o da vertente futurista baseada no que se convencionou chamar de “caligrama”, e da vertente construtivista baseada nos poemas do simbolista francês Stéphane Mallarmé (1896). Sobre o poema “Um lance de dados”, de Mallarmé, Philadelpho Menezes (1998, p. 29) comenta que “o uso de diferentes tipos de letras aproveita as novidades técnicas da imprensa da época”. Por outro lado, o poema foi pensado pelo escritor como uma partitura em que vozes variadas se sobrepõem numa polifonia feita de palavras.
De acordo com as referências concretas e com a inclusão da publicidade no jogo poético, os poetas concretos estabeleceram ligações com a música contemporânea através de oralizações de poemas e músicas elaboradas a partir de poemas concretos. Também se conectaram com as artes visuais através da arte concreta e do design construtivista.
Os poetas do grupo Noigandres reuniram a produção poética mundial e resgataram o pensamento moderno sobre a poesia, contribuindo decisivamente para a difusão da poesia visual no Brasil. Por fim, ultrapassaram o âmbito literário (livro, revista, jornal, cartaz, objeto, LP, cd, videotexto, holografia, vídeo, internet, logotipo), ampliando as possibilidades de criação na contemporaneidade. De acordo com Priscila Martins (2009), “trazendo essas considerações para o campo do design, podemos citar os logotipos, parte integrante de sistemas de identidade visual corporativa, que devem comunicar de maneira sintética e eficiente e atender a todas as especificações de reprodução nos mais variados tipos de suportes”. Slogans de cartazes e títulos editoriais também ganharam importância, assim como a tipografia, o desenho, as artes gráficas, o cinema e a publicidade.
Um pouco mais sobre a obra de Gomringer (selecione a opção tradução em português): http://www.aircube.at/eugen-gomringer